DOS CRIMES CONTRA O SENTIMENTO RELIGIOSO
- Ultraje a culto e impedimento ou perturbação de ato a ele relativo
Art. 208 - Escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso:
Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa.
Parágrafo único - Se há emprego de violência, a pena é aumentada de um terço, sem prejuízo da correspondente à violência.
São três as modalidades de crimes do tipo penal:
1. Escárnio de alguém publicamente por motivo de crença ou função religiosa
Objeto jurídico
Tutela-se a liberdade individual do homem de ter uma crença, bem como exercer o ministério religioso. Tutela-se também a própria religião contra o escárnio.
Ação nuclear
A ação nuclear típica da 1ª parte do art. 208 consubstancia-se no verbo escarnecer, que significa zombar, ridicularizar, de forma a ofender alguém, em virtude de crença ou função religiosa. O escárnio pode ser praticado por diversas formas: oral, escrita, simbólica etc.
Sujeito ativo
Qualquer pessoa pode praticar o delito em tela, inclusive aquelas que creem em determinada religião e os seus ministros.
Sujeito passivo
É a pessoa que crê em determinada religião ou que exerce o ministério religioso (padre, pastor, freira etc.). Deve necessariamente ser pessoa determinada.
Elemento subjetivo
É o dolo, consubstanciado na vontade livre e consciente de escarnecer de alguém, por motivo de crença ou função religiosa. Ausente essa motivação, outro crime poderá configurar-se, por exemplo, injúria.
Consumação e tentativa
Consuma-se com o ato de escarnecer publicamente. A tentativa somente é inadmissível na forma verbal do escárnio.
2. Impedimento ou perturbação de cerimônia ou prática de culto religioso
Objeto jurídico
Tutela-se também aqui a liberdade individual de professar uma crença religiosa e a liberdade de culto.
Por se tratar de crime contra cerimônia ou prática de culto religioso, protege-se também a ordem pública.
Ação nuclear
As ações nucleares da 2ª parte do art. 208 consubstanciam-se nos verbos:
impedir – consiste em não permitir o início ou prosseguimento da cerimônia ou prática de culto religioso;
perturbar – consiste em atrapalhar, perturbar, tumultuar a cerimônia ou culto religioso, por exemplo, proferir palavrões durante a cerimônia religiosa, fazer barulho para que o sermão do padre não seja ouvido pelos fiéis etc.
Sujeito ativo
Qualquer pessoa, esteja ou não participando da cerimônia ou da prática de culto religioso.
Sujeito passivo
S ão os fiéis que participam da cerimônia ou prática de culto religioso, bem como aqueles que realizam a sua celebração.
Elemento subjetivo
É o dolo, consubstanciado na vontade livre e consciente de impedir ou perturbar a cerimônia ou prática de culto religioso.
Admite-se o dolo eventual.
Consumação e tentativa
Consuma-se com o efetivo impedimento ou perturbação da cerimônia ou prática de culto religioso.
A tentativa é perfeitamente admissível.
3. Vilipêndio público de ato ou objeto de culto religioso
Objeto jurídico
Tutela-se, mais uma vez, a liberdade individual de crença e de culto religioso.
Ação nuclear
A ação nuclear típica da parte final do art. 208 consubstancia-se no verbo vilipendiar, isto é, tratar com desprezo, desdém, de modo ultrajante o ato ou objeto de culto religioso. Pode-se vilipendiar por meio escrito, por palavras, por gestos.
Deve o vilipêndio ser realizado publicamente, ou seja, na presença de várias pessoas.
Objeto material
O objeto material do crime é, portanto, o ato ou objeto de culto religioso. Ato religioso compreende a cerimônia ou a prática de culto religioso. Comete, portanto, o crime aquele que, durante o ato religioso, o vilipendia publicamente.
Elemento subjetivo
É o dolo, isto é, a vontade livre e consciente de vilipendiar o ato ou objeto de culto religioso.
Consumação e tentativa
Consuma-se o crime com a prática do ato ultrajante, por exemplo, atirar lixo contra a imagem sacra.
A tentativa é admissível nesses casos, em que o crime é material. Não será admissível, por exemplo, na hipótese em que o crime é praticado mediante ofensas verbais.
DOS CRIMES CONTRA O RESPEITO AOS MORTOS
Impedimento ou perturbação de cerimônia funerária
Art. 209 - Impedir ou perturbar enterro ou cerimônia funerária:
Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa.
Parágrafo único - Se há emprego de violência, a pena é aumentada de um terço, sem prejuízo da correspondente à violência.
Objeto jurídico
Protege-se o sentimento de respeito pelos mortos.
Elementos do tipo
Ação nuclear
As ações nucleares típicas são impedir ou perturbar, no caso, enterro ou cerimônia fúnebre. Admite-se que o crime seja praticado por omissão.
Sujeito ativo
Qualquer pessoa pode praticar o delito em tela.
Sujeito passivo
Cuida-se de crime vago, isto é, tem por sujeito passivo entidade sem personalidade jurídica, como a coletividade, a família e os amigos do morto. Este, por não mais ser titular de direitos, não pode ser sujeito passivo do crime em estudo.
Consumação e tentativa
Consuma-se o delito com o efetivo impedimento ou perturbação do enterro ou cerimônia funerária.
Se, apesar de terem sido empregados todos os meios idôneos, não se logra a concretização desses resultados, estamos diante da forma tentada do crime em estudo.
Violação de sepultura
Art. 210 - Violar ou profanar sepultura ou urna funerária:
Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.
Objeto jurídico
Protege-se o sentimento de respeito pelos mortos.
Elementos do tipo
Ação nuclear
(i) violar – devassar, abrir, descobrir, destruir, no caso, sepultura ou urna funerária. Com a violação, o cadáver ou as cinzas do defunto devem ficar expostos, mas não há necessidade de que sejam removidos;
(ii) profanar – tratar com desprezo, ultrajar, macular, aviltar, por exemplo, jogar excrementos sobre a sepultura ou urna funerária, destruir os ornamentos, escrever palavras injuriosas.
Objeto material
Deve necessariamente conter o cadáver. Urna funerária compreende as caixas, cofres ou vasos que contêm as cinzas ou ossos do morto.
Sujeito ativo
Qualquer pessoa pode praticar o delito em tela.
Sujeito passivo
Trata-se de crime vago. Sujeito passivo é a coletividade, a família e os amigos do falecido.
4. Elemento subjetivo
É o dolo, consubstanciado na vontade livre e consciente de violar ou profanar sepultura ou urna funerária.
Consumação e tentativa
O crime consuma-se com a violação ou profanação de sepultura ou urna funerária. A tentativa é perfeitamente admissível.
Destruição, subtração ou ocultação de cadáver
Art. 211 - Destruir, subtrair ou ocultar cadáver ou parte dele:
Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.
Objeto jurídico
É o mesmo do artigo antecedente: protege-se o sentimento de respeito pelos mortos.
Elementos do tipo
Ação nuclear
Trata-se de crime de ação múltipla ou conteúdo variado, de forma que a prática de qualquer uma das ações previstas na figura típica configura o delito em estudo.
As ações nucleares típicas consubstanciam-se nos seguintes verbos: destruir, subtrair, ocultar.
Objeto material
É o cadáver ou parte dele. Cadáver é o corpo privado da vida, mas que ainda conserva a forma humana. Assim, não se considera cadáver o esqueleto humano ou as suas cinzas.
Sujeito ativo
Qualquer pessoa pode praticar o delito em tela, inclusive a própria família do morto.
Sujeito passivo
Trata-se de crime vago. Sujeito passivo é a coletividade, a família e os amigos do falecido.
Elemento subjetivo
É o dolo, consistente na vontade livre e consciente de praticar qualquer uma das ações nucleares do tipo. Não se exige o chamado elemento subjetivo do tipo.
5. Consumação e tentativa
Consuma-se o crime com a destruição total ou parcial do cadáver. Na modalidade ocultar, o crime se consuma com o desaparecimento do cadáver ou de parte dele. Finalmente, na modalidade subtrair, o crime se consuma com a retirada do cadáver ou de parte dele da esfera de proteção e guarda da família, amigos etc.
A tentativa é possível.
Vilipêndio a cadáver
Art. 212 - Vilipendiar cadáver ou suas cinzas:
Pena - detenção, de um a três anos, e multa.
Objeto jurídico
Protege-se o sentimento de respeito pelos mortos.
Elementos do tipo
Ação nuclear
Consubstancia-se no verbo vilipendiar, isto é, ultrajar, tratar com desprezo, no caso, o cadáver ou suas cinzas.
Objeto material
É o cadáver ou suas cinzas. Cadáver é o corpo privado da vida, mas que ainda conserva a forma humana. Cinzas humanas constituem os resíduos da combustão ou cremação do corpo.
Sujeito ativo
Qualquer pessoa pode praticar o delito em tela, inclusive a própria família do morto.
Sujeito passivo
Trata-se de crime vago, ou seja, o sujeito passivo é a coletividade, a família e os amigos do falecido.
Elemento subjetivo
É o dolo, consistente na vontade livre e consciente de ultrajar, tratar com desprezo o cadáver ou suas cinzas.
Consumação e tentativa
Consuma-se o crime com a prática do ato configurador do vilipêndio. A tentativa é possível, salvo na hipótese de vilipêndio praticado verbalmente, pois se trata de crime unissubsistente.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Capez, Fernando. Curso de direito penal, volume 2, parte especial : arts. 121 a 212; 18. ed. atual. — São Paulo: Saraiva Educação, 2018.
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