quarta-feira, 8 de janeiro de 2025

ROTINA DE UMA CORREGEDORIA SETORIAL.

 Por Wagner Coelho

INTRODUÇÃO

A Corregedoria Setorial é um órgão vital dentro da estrutura das Organizações Policiais Militares (OPM), especialmente na Polícia Militar da Bahia (PMBA). Sua principal função é garantir a manutenção da disciplina e da ordem dentro da corporação, atuando na apuração de condutas que possam violar os princípios e valores institucionais. Para isso, a corregedoria realiza investigações internas, supervisiona processos disciplinares e mantém uma estreita relação com o Comando da unidade e outros órgãos de fiscalização e controle. Este trabalho explora as atividades, funções e responsabilidades da Corregedoria Setorial, além de discutir os documentos e normas que orientam suas operações.

 ATIVIDADE E ROTINA DE UMA CORREGEDORIA SETORIAL

A atividade de uma Corregedoria Setorial é essencialmente voltada para a manutenção da disciplina e dos padrões éticos dentro da OPM. Diariamente, essa seção lida com a recepção e análise de denúncias e queixas envolvendo militares, a instauração de procedimentos investigatórios, como Processos Administrativos Disciplinares (PAD), Sindicâncias e Inquéritos Policiais Militares (IPM), e a supervisão de sua correta instrução e finalização.

A rotina da Corregedoria Setorial inclui também a realização de auditorias internas e inspeções regulares para garantir que todos os processos estejam sendo conduzidos conforme as normas estabelecidas. O acompanhamento constante do andamento dos procedimentos é fundamental para evitar atrasos e garantir que as investigações sejam concluídas dentro dos prazos estipulados pela legislação.

Além disso, a Corregedoria Setorial desempenha um papel preventivo, promovendo ações educativas e de orientação aos membros da OPM sobre as normas disciplinares e as consequências de condutas inadequadas. Esse trabalho preventivo é crucial para a criação de um ambiente de trabalho seguro e respeitoso, onde os valores institucionais são preservados e os direitos dos policiais militares são protegidos.

FUNÇÕES DO OFICIAL CORREGEDOR SETORIAL

O Oficial Corregedor Setorial, geralmente um Capitão ou Tenente, é responsável por liderar as atividades da Corregedoria dentro da OPM. Suas funções são amplas e incluem tanto a coordenação das investigações quanto o aconselhamento ao Comando da unidade sobre questões disciplinares.

Entre as principais funções do Corregedor, destacam-se:

Supervisão de Investigações

O Corregedor deve garantir que todas as investigações sejam conduzidas de maneira imparcial, objetiva e em conformidade com as normas legais e regulamentares. Isso inclui a avaliação preliminar das denúncias recebidas, a designação de comissões de investigação e o acompanhamento de todas as etapas dos procedimentos investigatórios.

Elaboração de Pareceres

Ao final das investigações, o Corregedor elabora pareceres detalhados que serão submetidos ao Comando da unidade. Esses pareceres devem ser baseados em uma análise rigorosa dos fatos e das provas, indicando a responsabilidade ou inocência dos envolvidos e propondo as medidas disciplinares cabíveis.

Orientação e Capacitação

Além de suas funções investigativas, o Corregedor também desempenha um papel educativo dentro da OPM. Ele é responsável por orientar os demais membros da unidade sobre as normas disciplinares e promover capacitações para melhorar o entendimento e a aplicação dessas normas.

Apoio ao Comando

O Corregedor atua como um conselheiro do Comandante da OPM, oferecendo suporte em questões complexas que envolvem a disciplina e o comportamento dos militares. Essa função de apoio é crucial para que o Comando possa tomar decisões informadas e justas, baseadas em uma compreensão clara dos fatos e das implicações legais.

PAPEL JUNTO AO COMANDO DA UNIDADE

O Oficial Corregedor Setorial é um colaborador direto e essencial do Comando da unidade. Ele auxilia na manutenção da disciplina, oferecendo um ponto de vista técnico e legal sobre as questões que envolvem o comportamento dos militares. Essa proximidade com o Comando é fundamental para garantir que as decisões sobre disciplina e comportamento sejam tomadas com base em informações precisas e em conformidade com as normas institucionais.

O Corregedor desempenha um papel estratégico, pois suas atividades influenciam diretamente a capacidade do Comando de manter a ordem e a disciplina dentro da unidade. Sua função é também garantir que o Comando esteja sempre informado sobre os procedimentos investigatórios em curso, permitindo que decisões rápidas e eficazes sejam tomadas, minimizando o impacto de possíveis condutas inadequadas sobre a operação da unidade.

Além disso, o Corregedor ajuda o Comando a identificar padrões de comportamento que podem indicar problemas sistêmicos dentro da unidade, como falhas de treinamento ou questões de moral, permitindo a implementação de medidas preventivas ou corretivas. Assim, o papel do Corregedor junto ao Comando vai além de simplesmente conduzir investigações; ele também contribui para a gestão estratégica da unidade, fortalecendo a cultura de disciplina e ética.

VINCULAÇÃO COM OUTROS ÓRGÃOS E RESPONSABILIDADES

A Corregedoria Setorial, embora funcione dentro de uma unidade específica, não opera de forma isolada. Ela mantém uma relação estreita com a Corregedoria Geral da PMBA e com outros órgãos de fiscalização e controle, como o Ministério Público e o Judiciário.

A vinculação com a Corregedoria Geral é essencial para garantir a uniformidade dos procedimentos e o cumprimento das normas estabelecidas para as investigações. A Corregedoria Setorial deve seguir as diretrizes da Corregedoria Geral, especialmente em casos que demandam maior rigor investigativo ou que envolvam infrações graves. Isso garante que todas as unidades da PMBA sigam os mesmos padrões de investigação e que as decisões tomadas em uma unidade possam ser revisadas e confirmadas por órgãos superiores.

Além disso, a Corregedoria Setorial deve colaborar com o Ministério Público em investigações que envolvam crimes praticados por policiais militares. Essa colaboração inclui o envio de relatórios detalhados, a disponibilização de provas coletadas e a participação em audiências, quando necessário. A responsabilidade do Corregedor Setorial é garantir que todos os documentos e informações sejam transmitidos de forma precisa e tempestiva, respeitando os prazos legais e as exigências dos órgãos externos.

DOCUMENTOS PECULIARES À SEÇÃO E SEUS DESTINOS

A Corregedoria Setorial produz e lida com uma série de documentos essenciais para o andamento das investigações e para a tomada de decisões disciplinares. Entre os documentos mais comuns estão:

Portarias de Instauração

Esses documentos são usados para formalizar o início de investigações ou processos administrativos, designando as comissões responsáveis e especificando o objeto da apuração.

Relatórios de Investigação

Esses relatórios documentam o andamento das investigações, detalhando as atividades realizadas, as provas coletadas e as conclusões preliminares.

Soluções Disciplinares

São os documentos que formalizam as decisões finais sobre os casos investigados, incluindo as sanções aplicadas ou o arquivamento dos processos.

Pareceres Técnicos

O Corregedor elabora pareceres que orientam o Comando da unidade sobre as medidas a serem tomadas, baseando-se nas evidências e nas normas legais.

Encaminhamentos a Órgãos Externos

Quando necessário, a Corregedoria Setorial deve enviar determinados documentos a órgãos como o Ministério Público, incluindo relatórios de investigação, cópias de depoimentos e outras provas relevantes.

A correta gestão e encaminhamento desses documentos são fundamentais para garantir a transparência e a legalidade das investigações. Cada documento deve ser arquivado adequadamente, com cópias enviadas aos órgãos competentes e registros mantidos para consultas futuras.

NORMAS PARA ENCAMINHAMENTO DE FEITOS INVESTIGATÓRIOS À CORREGEDORIA DA PMBA

O encaminhamento de procedimentos investigatórios da Corregedoria Setorial para a Corregedoria Geral da PMBA é regido por normas específicas. Essas normas garantem que os processos sejam tratados de forma consistente em toda a corporação e que os casos mais graves ou complexos sejam supervisionados por órgãos de maior hierarquia.

Conforme o Boletim Geral Ostensivo (BGO) Nº 142 de 02 de agosto de 2010, os processos investigatórios, como o PAD e o IPM, devem ser encaminhados à Corregedoria Geral em situações específicas, como quando envolvem infrações de maior gravidade ou quando há necessidade de homologação das decisões. Além disso, todos os documentos encaminhados devem ser acompanhados de um relatório detalhado, que resuma as principais evidências e conclusões da investigação.

As normas também especificam os prazos e os procedimentos para o encaminhamento, assegurando que os processos sejam enviados de forma tempestiva e que a Corregedoria Geral tenha todas as informações necessárias para tomar decisões informadas.

CONCLUSÃO

A Corregedoria Setorial desempenha um papel crucial na manutenção da disciplina e da ordem dentro das unidades da Polícia Militar da Bahia. Através de suas investigações e do suporte ao Comando, ela assegura que as normas institucionais sejam rigorosamente aplicadas e que qualquer desvio de conduta seja devidamente apurado e corrigido. O trabalho do Oficial Corregedor Setorial é, portanto, essencial para a preservação dos valores e da integridade da corporação, garantindo que a Polícia Militar da Bahia continue a operar de maneira eficiente, ética e dentro dos parâmetros legais estabelecidos.

 

terça-feira, 4 de fevereiro de 2020

DIREITOS REAIS

1. Lógicas proprietárias; 2. Conceito de propriedade; 3. Atributos; 4. Características; 5. Função social; 6. Limitações; 7. Tipos de propriedade; 8. Aquisição; 9. Perda. 

Para STOLZE (2019), o direito de propriedade consiste no direito real de usar, gozar ou fruir, dispor e reivindicar a coisa, nos limites da sua função social. 
Para GONÇALVES (2017), pode-se definir direito de propriedade como o poder jurídico atribuído a uma pessoa de usar, gozar e dispor de um bem, corpóreo ou incorpóreo, em sua plenitude e dentro dos limites estabelecidos na lei, bem como de reivindicá-lo de quem injustamente o detenha. 
Direito fundamental e função social 
Nos termos do art. 5.º, XXII, da Constituição Federal, a propriedade é tratada e garantida como um direito fundamental. Logo em seguida, o inciso XXIII dispõe que “a propriedade atenderá a sua função social”.” 
Aspecto funcional 
Nessa linha, é forçoso convir que o conceito deste importantíssimo direito real na coisa própria deverá, necessariamente, levar em conta, sempre, o seu aspecto funcional. 
Direito Limitado 
Isso porque, nos dias de hoje, a propriedade não é mais considerada um direito ilimitado, como no passado. 
Linha harmônica com a Lei Fundamental 
Por tais razões, o Código Civil de 2002, ao tratar da propriedade, cuidou de manter uma linha harmônica com a Lei Fundamental, conforme podemos constatar: 
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. 
§ 1.o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas. 
Atos emulativos e abuso do direito de propriedade. 
O § 2.o do referido art. 1.228 proíbe os denominados atos emulativos, ou seja, aqueles que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem. 
Coisas corpóreas como incorpóreas 
O direito de propriedade recai tanto sobre coisas corpóreas como incorpóreas. Quando recai exclusivamente sobre coisas corpóreas tem a denominação peculiar de domínio, expressão oriunda de domare, significando sujeitar ou dominar, correspondendo à ideia de senhor ou dominus 
A noção de propriedade “mostra-se, destarte, mais ampla e mais compreensiva do que a de domínio. Aquela representa o gênero de que este vem a ser a espécie” 

ATRIBUTOS 

Usar, gozar e dispor dos bens, bem como reavê-los de quem injustamente os possua 

O conteúdo positivo do direito de propriedade é enunciado no art. 1.228 do Código Civil, ao enumerar os poderes elementares do proprietário: usar, gozar e dispor dos bens, bem como reavê-los de quem injustamente os possua. Correspondem eles ao jus utendifruendi, abutendi e à rei vindicatio, que eram os atributos da propriedade romana. 
Propriedade plena X  propriedade é limitada 
Quando todos os aludidos elementos constitutivos estiverem reunidos em uma só pessoa, será ela titular da propriedade plena. Se, entretanto, ocorrer o fenômeno do desmembramento, passando um ou alguns deles a ser exercidos por outra pessoa, diz-se que a propriedade é limitada. 
Direito de usar (jus utendi) 
Consiste na faculdade de o dono servir-se da coisa e de utilizá-la da maneira que entender mais conveniente, sem no entanto alterar-lhe a substância, podendo excluir terceiros de igual uso. A utilização deve ser feita, porém, dentro dos limites legais e de acordo com a função social da propriedade. Preceitua a propósito o § 1º do mesmo art. 1.228 do Código Civil que “o direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais...”. 
Direito de gozar ou usufruir (jus fruendi) 
Compreende o poder de perceber os frutos naturais e civis da coisa e de aproveitar economicamente os seus produtos. 
Direito de dispor da coisa (jus abutendi 
Consiste no poder de transferir a coisa, de gravá-la de ônus e de aliená-la a outrem a qualquer título. Não significa, todavia, prerrogativa de abusar da coisa, destruindo-a gratuitamente, pois a própria Constituição Federal prescreve que o uso da propriedade deve ser condicionado ao bem-estar social. 

CARACTERÍSTICAS 

Complexo 
É formado por um conjunto de poderes ou faculdades, sendo o mais completo de todos os direitos reais. 
Absoluto 
Não no sentido de que se possa fazer dele o que bem entender, mas porque a oponibilidade é erga omnes, podendo o seu titular desfrutar do bem como lhe aprouver, sujeitando-se às limitações constitucionais e legais. 
Perpétuo 
Não se extingue, simplesmente, pelo não uso, podendo ser transmitido indefinidamente por gerações. 
Exclusivo 
Ressalvadas certas situações, a exemplo do condomínio e da multipropriedade, o poder dominial de alguém exclui o de outrem,  concomitantemente, sobre a mesma coisa, sendo essa, portanto, a regra geral. 
Elástico  
Pode ser distendido ou contraído na formação de outros direitos reais sem perder sua essência. A propriedade é “elástica”, porquanto certos poderes ou faculdades que lhe são inerentes poderão ser destacados, para que sejam formados outros direitos, sem que isso implique sua destruição. 
Propriedade resolúvel e “ad tempus. 
Propriedade resolúvel é aquela que tem, em seu próprio título constitutivo, um elemento que limita potencialmente a sua duração, como uma condição resolutiva. 
A propriedade fiduciária, por sua vez, foi tratada, pelo Código Civil de 2002, em capítulo próprio, merecendo a nossa atenção oportunamente. 
ad tempus tem características próprias, embora esteja tratada, em nosso Código, no capítulo dedicado à propriedade resolúvel. Trata-se de uma modalidade de propriedade que, a priori, é constituída para ser definitiva e perpétua. Todavia, por um fato superveniente, ocorre a sua extinção, como é o caso da revogação da doação por ingratidão do donatário. 

FUNÇÃO SOCIAL 

Direito Romano e Idade Média 
No direito romano, a propriedade tinha caráter individualista. Na Idade Média, passou por uma fase peculiar, com dualidade de sujeitos (o dono e o que explorava economicamente o imóvel, pagando ao primeiro pelo seu uso). Havia todo um sistema hereditário para garantir que o domínio permanecesse numa dada família de tal forma que esta não perdesse o seu poder no contexto do sistema político. 
Revolução Francesa  
A propriedade assumiu feição marcadamente individualista. 
Século passada 
No século passado, no entanto, foi acentuado o seu caráter social, contribuindo para essa situação as encíclicas Rerum Novarum, do Papa Leão XIII, e Quadragésimo Ano, de Pio XI. 
Século XX 
O sopro da socialização acabou, com efeito, impregnando o século XX, influenciando a concepção da propriedade e o direito das coisas.  
Origem 
O princípio da função social da propriedade tem controvertida origem. Teria sido, segundo alguns, formulado por AUGUSTO COMTE e postulado por LÉON DUGUIT, no começo do aludido século.  
Em virtude da influência que a sua obra exerceu nos autores latinos, DUGUIT é considerado o precursor da ideia de que os direitos só se justificam pela missão social para a qual devem contribuir e, portanto, que o proprietário deve comportar-se e ser considerado, quanto à gestão dos seus bens, como um funcionário. 
Sistema constitucional contemporâneo 
Trata-se de uma inequívoca característica do sistema constitucional contemporâneo o respeito à função social, como forma de legitimação do próprio direito de propriedade. 
Art. 5.º, XXIII, CF/88, “a propriedade atenderá a sua função social 
Se há um instituto jurídico em que a função social ganha maior destaque, este é o direito de propriedade. Com previsão constitucional expressa e específica (art. 5.º, XXIII, CF/88), a ideia de que “a propriedade atenderá a sua função social” é uma premissa inarredável do ordenamento jurídico brasileiro. 
Posse-trabalho 
Trata-se de inovação de elevado alcance, inspirada no sentido social do direito de propriedade e também no novo conceito de posse, qualificada como posse-trabalho. 
Direito subjetivo do indivíduo X função social 
A propriedade deixou de ser o direito subjetivo do indivíduo e tende a se tornar a função social do detentor da riqueza mobiliária e imobiliária; a propriedade implica para todo detentor de uma riqueza a obrigação de empregá-la para o crescimento da riqueza social e para a interdependência social.  
Direito em contínua mudança 
Só o proprietário pode executar uma certa tarefa social. Só ele pode aumentar a riqueza geral utilizando a sua própria; a propriedade não é, de modo algum, um direito intangível e sagrado, mas um direito em contínua mudança que se deve modelar sobre as necessidades sociais às quais deve responder. 
LIMITAÇÕES 
Limitação Legal, jurídica e voluntária 
Restrições ao direito de propriedade 
Há leis que impõem restrições ao direito de propriedade, como o Código de Mineração, o Código Florestal, a Lei de Proteção do Meio Ambiente etc. Algumas contêm restrições administrativas, de natureza militar, eleitoral etc. A própria Constituição Federal impõe a subordinação da propriedade à sua função social. 
Cláusulas impostas voluntariamente 
Há ainda limitações decorrentes do direito de vizinhança e de cláusulas impostas voluntariamente nas liberalidades, como inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade. 
Direito de finalidade social 
Todo esse conjunto, no entanto, acaba traçando o perfil atual do direito de propriedade no direito brasileiro, que deixou de apresentar as características de direito absoluto e ilimitado, para se transformar em um direito de finalidade social. 
 Critério da utilidade 
O art. 1.229 do Código Civil limita a extensão da propriedade pelo critério da utilidade: até onde lhe for útil. Não pode o proprietário opor-se a trabalhos realizados por terceiros a uma altura ou profundidade tais, que não tenha ele interesse algum em impedi-los. A restrição é de cunho social. 
A propriedade do solo abrange a do espaço aéreo e subsolo correspondentes, em altura e profundidade úteis ao seu exercício, não podendo o proprietário opor-se a atividades que sejam realizadas, por terceiros, a uma altura ou profundidade tais, que não tenha ele interesse legítimo em impedi-las”. 
Espaço aéreo e ao subsolo 
Desse modo, o proprietário do imóvel tem direito não só à respectiva superfície como ao espaço aéreo e ao subsolo correspondentes. Tendo em vista, porém, que a propriedade é também fato econômico, a extensão do espaço aéreo e do subsolo se delimita pela utilidade que ao proprietário pode proporcionar.  
Impugnar a realização de trabalhos 
Por conseguinte, não lhe assiste o direito de impugnar a realização de trabalhos que se efetuem a uma altura ou a uma profundidade tais, que não tenha interesse legítimo em impedi-los. 
Solo para efeito de exploração ou aproveitamento 
Acrescenta o art. 1.230 do estatuto civil que “a propriedade do solo não abrange as jazidas, minas e demais recursos minerais, os potenciais de energia hidráulica, os monumentos arqueológicos e outros bens referidos por leis especiais ” que constituem 
propriedade distinta do solo para efeito de exploração ou aproveitamento e pertencem à 
União (CF, art. 176; Código de Mineração, art. 84). A propriedade do produto da lavra é do concessionário que a explora, cabendo ao proprietário do solo apenas participação nos resultados da lavra. 
TIPOS DE PROPRIEDADE 
Em geral, o objeto da propriedade é uma coisa especificamente determinada, entendida como um bem corpóreo móvel ou imóvel. 
Propriedade literária, artística e científica 
Seus partidários admitem a existência de propriedade literária, artística e científica, que, recaindo nas produções do espírito humano, teria como objeto bens imateriais. Outros vão adiante, sustentando que os direitos podem ser objeto de propriedade. 
Fundo de comércio, a clientela, o nome comercial, as patentes de invenção 
 Recentemente, o conceito de propriedade alarga-se abrangendo certos valores, como o fundo de comércio, a clientela, o nome comercial, as patentes de invenção e tantos outros.  
Propriedade industrial 
Fala-se, constantemente, em propriedade industrial para significar o direito dos inventores e o que se assegura aos industriais e comerciantes sobre as marcas de fábricas, desenhos e modelos. Chega-se até a admitir a propriedade de cargos e empregos. 

AQUISIÇÃO 
O Código Civil de 2002 trata dos diversos modos de aquisição, separando a propriedade imóvel da móvel, conferindo tratamento diferente a uma e outra. 
AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE IMÓVEL 
O novo diploma disciplinou, no capítulo intitulado “Da aquisição da propriedade imóvel”, a usucapião, o registro do título e a acessão (arts. 1.238 a 1.259). 
Originária e Derivada 
Quanto à procedência ou causa da aquisição, esta pode ser originária e derivada.  
Originária:  
quando não há transmissão de um sujeito para outro, como ocorre na acessão natural e na usucapião. O indivíduo, em dado momento, torna-se dono de uma coisa por fazê-la sua, sem que lhe tenha sido transmitida por alguém, ou porque jamais esteve sob o domínio de outrem. Não há relação causal entre a propriedade adquirida e o estado jurídico anterior da própria coisa. 
Derivada: 
quando resulta de uma relação negocial entre o anterior proprietário e o adquirente, havendo, pois, uma transmissão do domínio em razão da manifestação de vontade, como no registro do título translativo e na tradição. 
Espécies de usucapião de bens imóveis:  
a extraordinária, a ordinária e a especial ou constitucional, dividindo-se a última em rural (pro labore) e urbana (pró-moradia ou pro misero e familiar). Há, ainda, uma modalidade especial, a usucapião indígena. 
Usucapião extraordinária 
A usucapião extraordinária é disciplinada no art. 1.238 do Código Civil e seus requisitos são: posse de quinze anos (que pode reduzir-se a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo), exercida com ânimo de dono, de forma contínua, mansa e pacificamente. Dispensam-se os requisitos do justo título e da boa-fé. 
Usucapião ordinária 
A usucapião ordinária apresenta os seguintes requisitos: posse de dez anos, exercida com ânimo de dono, de forma contínua, mansa e pacificamente, além de justo título e boa-fé. Dispõe, com efeito, o art. 1.242 do Código Civil. 
Usucapião especial 
chamada de constitucional por ter sido introduzida pela Constituição Federal sob duas formas: usucapião especial rural, também denominada pro labore, e usucapião especial urbana, também conhecida como pró-moradia. A de 1934 consagrou a modalidade rural, que está também regulamentada no art. 191 da Carta de 1988 e no art. 1.239 do Código Civil de 2002. 
Usucapião especial rural 
A usucapião especial rural ou pro labore surgiu, no direito brasileiro, com a Constituição Federal de 1934, sendo conservada na Carta outorgada de 1937 e na Constituição de 1946. A Constituição de 1967 e a Emenda Constitucional de 1969 não repetiram o texto das anteriores, mas a última consignou os seus requisitos básicos, remetendo a sua disciplina à lei ordinária. 
Usucapião especial urbana 
A usucapião especial urbana constitui inovação trazida pela Constituição Federal de 1988, estando regulamentada em seu art. 183:  
Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural”. 
Usucapião familiar 
A Lei n. 12.424, de 16 de junho de 2011, criou uma nova modalidade de usucapião especial urbana – também denominada usucapião pró-moradia e que vem sendo chamada de usucapião familiar –, inserindo no Código Civil o art. 1.240-A e seu § 1º, 
Usucapião indígena 
Índios ou silvícolas são os habitantes das selvas, não integrados à civilização. Nos termos do art. 4º, parágrafo único, do Código Civil de 2002, a “capacidade dos índios será regulada por legislação especial”. 
Usucapião extrajudicial 
O art. 1.071 do novo Código de Processo Civil de 2015 introduziu na Lei dos Registros Públicos (Lei n. 6.015/73) o art. 216-A, admitindo a usucapião extrajudicial, processada diretamente perante o cartório do registro de imóveis da comarca em que situado o imóvel usucapiendo. 

DA AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE MÓVEL 
O Código de 2002 disciplina seis modos de aquisição da propriedade móvel: a usucapião, a ocupação, o achado do tesouro, a tradição, a especificação e a confusão. Juntamente com a última, trata o aludido diploma também da comistão e da adjunção. 
Da usucapião 
A usucapião de coisas móveis não apresenta a mesma importância da de imóveis. Prevê o Código Civil prazos mais reduzidos para a primeira. 
Da ocupação 
Ocupação é modo originário de aquisição de bem móvel que consiste na tomada de posse de coisa sem dono, com a intenção de se tornar seu proprietário. 
Do achado do tesouro 
O Código Civil denomina tesouro o depósito antigo de coisas preciosas, oculto e de cujo dono não haja memória. Se alguém o encontrar em prédio alheio, dividir-se-á por igual entre o proprietário deste e o que o achar casualmente. 
Da tradição 
Pelo sistema do Código Civil brasileiro, como já foi dito, o contrato, por si só, não transfere a propriedade, gerando apenas obrigações. A aquisição do domínio de bem móvel só ocorrerá se lhe seguir a tradição. Esta consiste, portanto, na entrega da coisa do alienante ao adquirente, com a intenção de lhe transferir o domínio, em complementação do contrato. 

PERDA DA PROPRIEDADE 
Entendeu o legislador que era despiciendo separar as formas de perda de propriedade móvel das formas de perda de propriedade imóvel, já que as modalidades são aplicáveis a ambas. 

Sobre a perda da propriedade móvel ou imóvel, dispõe o Código Civil de 2002: 
Art. 1.275. Além das causas consideradas neste Código, perde-se a propriedade: 
I – por alienação; 
II – pela renúncia; 
III – por abandono; 
IV – por perecimento da coisa; 
V – por desapropriação. 
Parágrafo único. Nos casos dos incisos I e II, os efeitos da perda da propriedade imóvel serão subordinados ao registro do título transmissivo ou do ato renunciativo no Registro de Imóveis. 
Alienação 
Uma das formas mais comuns de realizar a transferência de propriedade é pela alienação. 
Traduz a transferência da titularidade da propriedade, a exemplo do que se dá como efeito da tradição decorrente da compra e venda. O vendedor, por óbvio, perde a sua propriedade em favor do adquirente. 
Renúncia 
Uma outra modalidade de perda de propriedade é a sua renúncia. Consiste em um ato formal de abdicação da coisa, como ocorre no ato renunciativo de um imóvel, lavrado e registrado em cartório. 
Abandono 
O art. 1.275, III, do Código Civil de 2002 elenca também o abandono como uma forma de perda de propriedade. Conforme já antecipamos no tópico anterior, o abandono é informal, ou seja, consiste na mera “deixação material da coisa”, independentemente de escrituração ou registro cartorário, diferentemente da renúncia ao bem. 
Perecimento da coisa 
perecimento também opera o fim da propriedade, na medida em que consiste na destruição do próprio bem, como na situação em que uma peça de ferro é completamente arruinada pela força da maresia. 
Desapropriação 
desapropriação, tema estudado no âmbito do Direito Administrativo, também resultará na extinção da propriedade. 
Trata-se de uma modalidade de perda da propriedade de iniciativa do Poder Público, que, mediante prévio procedimento e justa indenização, por necessidade, utilidade pública ou por interesse social, expropria um bem de seu titular original. 
Trata-se de forma de extinção da propriedade prevista no texto constitucional. Com efeito, preceitua o inciso XXIV do art. 5.º da Constituição Federal de 1988: 
XXIV – a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição; 
Usucapião 
Considerando-se a usucapião uma forma de prescrição aquisitiva, olvida-se, comumente, que há dois lados da mesma moeda, uma vez que, para alguém usucapir a propriedade, seu antigo titular terá de perdê-la. Com efeito, na medida em que a propriedade é adquirida por alguém, outrem estará perdendo-a, seja de bem móvel ou imóvel. 
Confisco 
Se a desapropriação é uma modalidade de perda da propriedade em que o Poder Público, mediante prévio procedimento e justa indenização, por necessidade, utilidade pública ou por interesse social, retira um bem do patrimônio de seu titular original, o confisco segue a mesma linha, porém sem qualquer compensaçãoTrata-se de situação absolutamente excepcional no sistema. 

REFERÊNCIAS BIBLOGRÁFICAS 
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: Direitos Reaisv. 5. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019.  
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito das coisasv. 5. 12 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2017.